Piloto revela que apoio familiar foi fundamental para suas conquistas na temporada
Mateus Bezerra,
Especial para o SBK
Acomodado. Uma palavra que não existe no dicionário de Luiz Zuliani. O fato de não tomar conhecimento dessa palavra faz com que o piloto de 43 anos busque constantemente sua evolução. A maior prova disso é a conquista do título do SuperBike Brasil, em 2020, pela categoria Escola Estreante. Título do qual o campeão deixa bem claro que não seria possível se não fosse o apoio familiar.
“A minha família é base do Zuliani que conseguiu ser campeão do SuperBike. Fui instruído de uma forma para considerar que a pessoa que está do meu lado, seja adversário ou não, é um ser humano”, afirma o atleta que colecionou inúmeros troféus na temporada.
Nascido em Niscemi, comunidade italiana da região de Sicília, o número 67 do maior campeonato da América Latina sempre foi um praticante de esporte. Aos 3 já lutava judô, depois passou por outros esportes como futebol e até mesmo fisiculturismo. Dentre todos os esportes que praticou em sua vida, apenas o futebol é coletivo. Até por isso, o piloto traz consigo um autoconhecimento que complementa sua busca por evolução.
“Sempre pratiquei esportes individuais, e ao contrário dos esportes coletivos, que alguém pode levar o crédito mesmo sem merecer, no individual a responsabilidade é sua. Ou você faz, ou não faz. Até por isso, eu conheço muito bem o meu limite. Sei onde posso chegar ou não. O ser humano tem um limite, que chega a um ponto que não tem mais como forçar”, diz.
Outro fator que também evidencia sua não comodidade, é o seu poder de superação. Em 2017 teve que superar o falecimento de seu pai, Luiz, sua grande fonte de inspiração, ou como intitula o próprio filiho, seu “herói”. Além de superações em sua vida pessoal, Zuliani enfrentou obstáculos dentro das pistas, que tornaram sua jornada rumo ao título ainda mais inesquecível.
As lições que a vida trouxe
Na primeira etapa da temporada, que aconteceu no Autódromo de Interlagos, em São Paulo, esqueceu que pilotava uma moto com um escapamento mais curto do que o de costume, o que resultou em uma dolorida queimadura em sua panturrilha. Mesmo assim, conquistou podium. “Na largada, por causa da empolgação, esqueci a perna em cima do escapamento. Ele furou o macacão, a segunda pele e foi direto na minha panturrilha. Na sexta volta eu ainda não conseguia colocar a perna na pedaleira, mas continuei focado e terminei em terceiro lugar”, relembra ao mostrar seu troféu da ocasião.
Depois disso, acumulou experiências que considera fundamentais para seu crescimento. Pela 5ª etapa da competição, também em Interlagos, sofreu uma queda durante a prova. Na etapa seguinte, em Curitiba, as dificuldades se acentuaram. “Eu estava com um stress muito grande na etapa de Curitiba. Além do tombo, vinha passando por uma série de problemas pessoais. Isso não me deixou andar bem, eu fiquei frustrado. Tanto é que quando deixei o autódromo mandei uma mensagem para os meus mecânicos pedindo desculpas”, explica.
Na ocasião, Zuliani terminou a prova na quinta posição da categoria. A sua carga emocional poderia ser um obstáculo que o impedisse de pontuar, mas, mais uma vez, seu autoconhecimento fez toda a diferença. “Percebi que não tinha condições físicas, então quando eu vejo que posso me colocar em perigo, ou outro alguém em perigo, eu deixo meu adversário ultrapassar. Não divido curva para derrubar ninguém, prefiro esperar uma nova chance para ultrapassar”, reforça.
Ao chegar na penúltima etapa, realizada no Autódromo de Potenza, em Lima Duarte, Minas Gerais, foi preciso enfrentar novos desafios, para colher novos aprendizados. Sua moto acabou tendo todo o seu sistema eletrônico danificado, logo no primeiro dia de reconhecimento de pista. Até mesmo por isso, na tarde de sexta correu sem a parte eletrônica, cambiando na mão.
Ao anoitecer, solicitou ao motoboy, Júnior Marinho, que fosse de São João da Boa vista até Araras buscar o sensor para sua moto, para entregar na cidade mineira. Ao todo, foram 1.600 km rodados por Júnior, em cima de sua CG 150. Chegado o dia da prova, um novo problema surgiu. “Quando o sensor chegou e acertamos a moto para sábado, eu percebi que não tinha mais Quick, pois ele tinha perdido o tempo. Então, quando eu batia de quarta para terceira e depois para segunda, ali no tobogã, na curva zero, a moto entrava em neutro”, revive.
Apesar das adversidades que antecederam a corrida, um quesito pendeu a balança para o lado que poderia favorecer o piloto: a chuva. Antes da prova categoria passou a chover forte em Lima Duarte e por ser um piloto que se sente bem correndo em pista molhada, Luiz ganhou confiança. “Quando começou a chuva na hora da corrida, pensei comigo mesmo que estava tudo dando certo. Consegui o sensor, o Quick está falhando, mas todo mundo vai tirar a mão”, explica.
Apesar de ter feito um bom início de prova, largando por dento para fazer o cotovelo da curva, Zuliani acabou caindo ao passar por uma poça d’água, ainda na segunda volta. Porém, devido à forte chuva, a prova foi cancelada, o que lhe cedeu a segunda colocação. Mesmo com o segundo lugar somando em sua pontuação geral, o piloto de Mogi Mirim sofreu lesões no joelho e costela por conta da queda.
A constante busca pela evolução
Para Luiz, não se trata apenas sobre vencer, mas sim ir em busca do seu melhor. Com planos de competir pela categoria Evo Light na temporada que está por vir, o atual campeão da Estreante deixa bem claro que é movido a desafios.
“Eu poderia andar mais um ano na Escola, mas eu vejo que passar mais um ano nessa categoria pode ser que eu não evoluía o quanto eu necessite. Eu vejo alguns pilotos que eu gostaria de dividir a pista. Até mesmo para evoluir. Ficar na Escola ‘papando’ troféus não seria interessante, mas sim buscar evoluir. Se não, não tem o desafio e eu preciso disso”, ressalta.
“Não posso ir para uma etapa apenas para sair vitorioso. Acho que não é assim que funciona. Acredito muito o que funciona é a evolução e o SuperBike te dá essa oportunidade. Você desistir a qualquer momento da sua categoria e evoluir”, completa.
Em Goiânia, novos desafios
A disputa pelo título da categoria Escola Estreante acabou ficando para a última etapa, que aconteceu em Goiânia. Mas antes da prova, mais um susto. Na sexta volta do treino não oficial, realizado às quintas, o atleta sofreu uma queda, na qual deslizou até as barreiras de ar. No entanto, devido ao alto investimento direcionado à segurança dos competidores, ele e sua moto saíram ilesos.
Quando o resgate se aproximava para o pronto atendimento, o piloto sinaliza que estava bem e que voltaria para a pista. A determinação e a vontade de vencer “O Belmiro (diretor de prova SBK) conversou muito comigo na sexta-feira sobre a pancada que eu dei na barreira, no sábado também. O Dr. Gabriel foi outro que me chamou para conversar. Queria entender se eu estava nervoso ou preocupado com algo e expliquei que estava apenas preocupado com o campeonato, que queria ser campeão. Ser preocupado é uma coisa, estar nervoso é outra”, pontua o piloto, que completa. “Expliquei que estava totalmente lúcido e que correria com o regulamento debaixo do braço. Sabia que não precisava provar nada para ninguém”, afirma.
Foi justamente o que acabou fazendo. No sábado, liderou seu treino de ponta a ponta, garantindo a Pole Position de sua categoria. No dia da prova, como de costume, não realizou o warm-up. Apesar da conquista da Pole, logo na largada caiu para a quarta posição. Cenário que não durou muito tempo. Logo na segunda volta, a ultrapassagem para cima de Felipe Bittencourt o deixou mais tranquilo para o restante da prova.
“Fiz a ultrapassagem no “S” lento, indo para a curva da vitória e comecei a abrir. Quando eu deixei de ouvir o barulho da moto dele, dei uma olhada para trás e vi que ele não chegaria mais. Depois, foi só administrar e evitar qualquer erro. Dessa forma venci a corrida”, diz ao reviver seu momento de glória.
“A hora que eu recebi a bandeirada e olhei para cima, não acreditei. Pensei o quanto era demais tudo aquilo. Eu não cabia dentro do corpo, parecia que minha alma tinha saído. Eu tentava abrir o macacão, e chorando, o pessoal passando, querendo falar comigo e eu não conseguia nem responder. Foi uma emoção muito grande. Foi a maior sensação que eu tive de prazer e euforia em toda minha vida”, descreve.
Assim como citado no início, dois elementos são essenciais na jornada de Zuliani: família e evolução. “Subir no podium, o Ale (narrador) falar seu nome, você saber que sua família está em casa te assistindo, porque eles não puderam ir até Goiânia, é uma sensação indescritível. Entrei no campeonato sem saber se conseguiria pontuar e fui campeão. Como amadureci nesse tempo. Como os tombos me fizeram bem”.